domingo, março 21, 2010

A Ministra Aficionada

Qual é a fronteira entre a cultura e a crueldade?






Quanta dignidade tem um espectáculo que inclui actores que são forçados a participar?
No dia 11 de Fevereiro foi criada a secção de tauromaquia do Conselho Nacional de Cultura que segundo o Despacho n.º 3254/2010, de 22 de Fevereiro, onde estão representados empresários tauromáquicos, ganadeiros, toureiros e forcados.
Como podemos comprovar ao ler este Despacho, esta secção não serve para resolver assuntos de pormenor nem é inocente. Nos seus objectivos estão incluídos pontos como o "desenvolvimento das linhas de política cultural para o sector da tauromaquia" e o "bom desenvolvimento da temporada tauromáquica", bem como a "dignificação da actividade tauromáquica".
A Ministra da Cultura Maria Gabriela Canavilhas clarifica-se, não querendo ser equidistante às posições antagónicas que existem na população portuguesa sobre touradas. O que nem surpreende, pois já tinha tomado partido ao ter participado no Fórum Mundial da Cultura Taurina, enquanto directora regional da Cultura dos Açores.
A Ministra da Cultura afasta-se assim da representatividade que devia ter e opta antes por exercer o seu poder para fazer aquilo que gosta, o que não é responsável nem justo para o restante universo cultural que definha com a falta de apoio e desinteresse por parte do Governo, nem com quem paga impostos e não aceita que sequer um cêntimo seu sirva para alimentar um negócio privado baseado na concepção de que os touros existem para serem violentados.
Este descaramento já originou inúmeros protestos de personalidades ligadas ao mundo da cultura desde escritores, músicos, historiadores, humoristas (sinceramente já perdi a conta). E também das associações de direitos dos animais, que já se insurgiram contra este disparate, estando marcada uma marcha para dia 10 de Abril entre o Campo Pequeno e a Assembleia da República.
O Bloco de Esquerda junta-se a esta onda de protestos, tendo sido o único partido a colocar-se contra a criação desta secção "anacrónica" e "incompreensível". O Bloco tem também sido oposição à sorte de varas nos Açores e fez toda a diferença na Autarquia de Sintra para que esta deixasse de apoiar, com dinheiro e recursos públicos, o negócio da tauromaquia.
A luta pelo fim das touradas não é fácil, mas já foi mais difícil. Quando um negócio ganha o estatuto de raiz cultural e de única forma popular de entretenimento não chega defender o seu fim, ignorando arrogantemente o seu enquadramento social e as relações de força que existem agora. Sem uma política cultural alternativa não há alternativas culturais e a tourada manter-se-á. E esta política não existirá com a actual Ministra da Cultura.
Hugo Evangelista

Esquerda.Net

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