quarta-feira, março 17, 2010

Má sorte nascer com pelos e ter um dono "alérgico"


por Sandra Moutinho (texto) e Miguel Lopes (fotos), da Lusa
Canil Municipal de Lisboa, situado no parque de Monsanto em Lisboa, onde todos os anos milhares de animais domésticos (cães e gatos) são abandonados na cidade de Lisboa
(COM GALERIA) Os animais do Canil Municipal de Lisboa não são felizes. Se o fossem, não estavam lá. Muitos são levados pelos donos que, subitamente, descobrem que são alérgicos aos pelos. Alguns têm "cadastro", mas a maior parte tem apenas pouca sorte.
Fotografia © Miguel A. Lopes-Lusa
Canil Municipal de Lisboa, situado no parque de Monsanto em Lisboa, onde todos os anos milhares de animais domésticos (cães e gatos) são abandonados na cidade de Lisboa

São mais os cães e gatos que entram para este canil-gatil, situado em Monsanto, do que os que saem adoptados. A maioria é levada pelos donos, que dão as mais criativas desculpas: têm alergia aos pelos, não suportam o ladrar e o miar, os vizinhos estão chateados ou o cônjuge não gosta do animal. A chegada de uma criança ao agregado familiar também motiva muitas entregas.
Cristina Costa Gomes, chefe da Divisão de Higiene e Controlo Sanitário da Câmara Municipal de Lisboa (CML) e responsável pelo canil, contou à Lusa que a instituição aceita os animais porque, se não o fizer, o mais provável é acabar por recolhê-los em situação de abandono.
O canil também vai buscar animais, faz recolhas na via pública ou acolhe animais que foram trazidos pelas forças de segurança que os encontram em actos ilícitos, como lutas de cães ou mesmo assaltos.
Estes últimos, de raças que a lei classifica de potencialmente perigosas, ficam a aguardar por uma decisão do tribunal e alguns acabam por esperar anos nestas circunstâncias.
Os animais com cadastro estão numa sala à parte, numa boxe especial que garante segurança ao tratador. A sua fisionomia assusta. Alguns têm histórias de maus tratos. Muitos vivenciaram ou participaram em actos violentos. Só um grande golpe de sorte lhes proporcionará um novo dono e um lar feliz.
Os outros, a maior parte de raça indefinida, mas não só, ladram à presença humana. Abanam o rabo a oferecer a sua companhia. Mas as adopções são só para um terço dos que por ali passam.
Cristina Costa Gomes gostava que esta percentagem subisse aos 100 por cento, embora reconheça ser um objectivo, mais do que ambicioso, inalcançável, principalmente enquanto o canil tiver tão má fama.
"Chamam-nos de tudo: nazis, assassinos. Aos que o dizem, convido-os a virem ver com os seus olhos. Estamos aqui para trabalhar para os animais e também em nome da saúde pública. Trabalhamos para os que gostam de animais e os que não gostam de animais. Mas todos precisamos de saber o nosso papel", sublinhou.
Talvez por causa da crise - económica ou de valores - são cada vez mais os animais que habitam este canil. Em 2009, foram recolhidos em casa, a pedido dos donos, 186 cães e 23 gatos.
No mesmo período, o canil recebeu - a maioria da mão dos donos - 951 cães e 447 gatos. Pelas capturas nocturnas chegaram 57 cães e 247 gatos. Muitos dos felinos foram depois recolocados na rua, após esterilização.
Entre tantos animais, alguns têm histórias dignas de filme. Como "Brown", o cão que chegou quase morto depois de cair de um sexto andar. Depois de muitas cirurgias, conseguiu erguer-se. É um dos três felizardos que moram numa parte externa do canil.
Apesar de ter obras previstas há mais de uma década, só agora o canil vai finalmente ficar concluído. Pelo meio ficou um projecto descabido que foi abandonado e um empreiteiro que não terminou a obra e deixou metade do canil com ar de ruínas.
O objectivo das obras é melhorar as instalações dos animais, proporcionando-lhes mais liberdade de movimentos e melhores condições. Mais ambicioso é o propósito maior: não haver razão para o canil existir.

Fonte: DN.

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